(nesse domingo minha vó fez 81 anos. Eu, Dudu e minha mãe fomos ao Rio de Janeiro visitá-la)
Minha vó não pinta mais o cabelo. Há um ano, está todo branco e preso num rabo bem penteado. Sua pele fina e macia é cada dia mais clara – o que me faz perceber que seus olhos são na verdade verdes, como os de sua mãe. Dessa vez, também reparei numa manchinha em seus lábios, antes sempre encobertos de batom.
Quanto menos ela sai pra rua, maior fica o apartamento. Cômodos vazios e fechados remetem à época em que seus cinco filhos moravam ali. Hoje os corredores são longos demais e os móveis já sem utilidade. O único quarto com vida é o que ela enche de risadas e fotos nas paredes – pra lembrar do passado que não esquece.
Histórias transbordam de sua memória e ela as coloca pra fora quase que por necessidade. São relatos de sua infância em Portugal, de sua chegada ao Brasil e de seus antepassados. Conta como se tivessem acontecido ontem, com detalhes por vezes precisos demais pra se acreditar. Diálogos, cores de roupas e nomes de ruas confundem até o mais atento dos ouvintes – mas não ela, que costura uma cena à outra com enredos dignos de cinema.
Enquanto fala, me segura com uma mão e leva a outra ao coração. Revive cada momento, com lágrimas nos olhos e gargalhadas. Quando era mais nova, achava que minha vó simplesmente gostava de contar histórias. Hoje percebo que é uma maneira de se manter viva e eternizar os que já se foram. Aquelas lembranças são parte dela – assim como são parte de mim.
Comentários