Desde que me lembro, minha vó era muito: falava muito, saia muito, ria muito. Às vezes, era até demais. Quando a visitava, corria pra acompanhar seu ritmo e acabava sempre esgotada de tanto ouvir suas histórias e passear por aí. Mas, há pouco tempo, ela caiu, quebrou o quadril e nunca mais foi a mesma…
Desde então, ela é muito menos. Não consegue caminhar, precisa de ajuda para quase tudo e sua audição cada vez mais fraca a fez uma senhora de poucas palavras. Seu quarto se transformou em sua casa – com geladeira, máquina de lavar roupa e microondas – e lá ela passa os dias assistindo à televisão.
Essa semana, eu e minhas irmãs fomos ao Rio de Janeiro visitá-la. Por um lado, foi muito difícil vê-la tão fragilizada e recolhida – apesar de estar bem de saúde e muito bem cuidada, é impossível não se entristecer diante da sua desvitalidade. Mas, por outro lado, nunca me senti tão conectada a ela quanto dessa vez.
Na ausência do barulho, do movimento, do batom, do perfume e das joias, restou apenas a minha vó.
Deitada ao lado dela, senti o toque fino de sua pele, tracejei as veias saltadas em seu braço e acariciei os cabelos cortados por ela mesma. Percebi como eu e minhas irmãs herdamos seus traços – e como suas pernas são parecidas com as da minha mãe. Contemplei-a dormindo e vi uma mulher forte, mas que, no fundo, é apenas humana.
E de tudo que já vivemos juntas, nada me comoveu mais que esses momentos em que estivemos em silêncio, de mãos dadas. Ou o sorriso que ela abria quando a gente entrava pela porta. Ou quando olhei em seus olhos e disse que a amava – e ela olhou nos meus e disse: “Eu sei, filha. Eu também te amo”.
Voltei para Florianópolis com o coração apertado e os olhos cheios de lágrimas – mas com a sensação que recebi um presente muito valioso: a minha querida vó.