top of page

Depois de três horas sacolejando, nosso ônibus chega à beira de um rio. Assim que descemos, começa a chover e a poeira da estrada sobe por nossas pernas. Corremos pro barquinho que nos levará ao outro lado. Para cá, vêm crianças de uniforme e mochilas; para lá, vão turistas carregados de malas.

Caraíva é uma pontinha de terra espremida entre uma reserva indígena, um rio e o mar. Ali só se chega de barco. Não há carros, nem motos, nem sinal de celular. São apenas dez ruas, todas de areia fofa. As pousadas são simples, o comércio é simples, as pessoas são simples – mas com um coração enorme.

No dia seguinte, acordamos cedo e saímos para passear. Caminhamos até uma praia cor-de-rosa, remamos de stand up paddle, subimos o rio de caiaque e descemos de boia. Almoçamos pastel de camarão com cerveja – seguidos de um cochilo na areia. À tarde nadamos no canal da barra e à noite jantamos num restaurante delicioso.

De volta à pousada, deitei na cama e encarei o teto escuro. O barulho das ondas preencheu o quarto e ecoou em meus ouvidos. Senti a alegria presente em cada célula do meu corpo. Tentei decifrar o que tinha feito daquele dia tão especial – mas, antes que chegasse a uma conclusão, o cansaço me roubou pros meus sonhos.

Acordei determinada a não ir embora. Nem precisei convencer o Dudu, Caraíva já tinha conquistado ele também. Juntamos nossos trocados para pagar mais uma diária (o próximo caixa eletrônico está a quilômetros dali e quase ninguém aceita cartão) e saímos correndo para repetir tudo que fizemos no dia anterior.

Naquela tarde, enquanto caminhávamos ao pôr do sol, conversamos sobre nós dois. Nas últimas semanas, nossa relação tinha sido desgastada pela falta de tempo e excesso de preocupação. A rotina cresceu entre a gente, nos tornando distantes e inacessíveis. Caraíva diluiu o que nos separava e nos trouxe mais próximos que nunca.

Faz três meses que voltamos, mas ainda suspiramos por aquele lugar. Lá percebemos que a vida pode ser muito simples, mesmo quando é complicada. Apesar do barulho, dos compromissos e do agito da cidade, sempre encontraremos um pedacinho de Caraíva dentro de nós – e ele se chama “paz”.

(Esse post é de uma viagem que eu e Dudu fizemos em julho pra Bahia. Aqui tem a primeira parte do relato)

Essa semana uma chuva nos pegou desprevenidos. Em segundos, o dia virou noite e o céu desabou. Nos protegemos numa marquise, mas a trégua parecia distante. “Vamos correr?”, você sugeriu. Fui o mais rápido que pude, enquanto gotas pesadas ardiam em minha pele e o cabelo grudava na testa molhada.

Uma euforia tomou conta de mim e comecei a rir. Olhei pra trás e você sorria também. Passamos por pessoas em seus carros e guarda-chuvas – mas, naquele momento, éramos só nós dois no mundo: correndo e rindo. Mais pra frente, demos as mãos e seguimos andando devagar. Meu vestido pingava e meu corpo tremia, mas já não tinha pressa. Estava onde queria estar.

Com você, aprendi que mais importante que sermos um só é sermos dois caminhando lado a lado. Aprendi que é possível se apaixonar infinitas vezes pela mesma pessoa – e que, com o tempo, a paixão vem carregada de sentimentos ainda mais profundos, como admiração, respeito e gratidão. Aprendi também que o amor resiste a tempestades e calmarias – se nenhum desafio for maior que nossa vontade de ficar juntos.

Hoje faz dez anos que nos tornamos oficialmente companheiros. Nunca duvidei que chegaríamos até aqui, só não imaginava que chegaríamos tão fortes e em tamanha sintonia. Hoje tenho a serenidade de te amar todos os dias, de coração aberto, com a certeza que será eterno enquanto quisermos que seja – e por qualquer caminho que a vida nos levar.

Na sexta-feira, vi um vídeo que mexeu comigo. Eram duas gêmeas cantando enquanto se olhavam e sorriam. A internet está cheia de crianças prodígio, mas aquelas me tocaram de maneira especial. Tive a certeza que eram dois seres iluminados – fazendo exatamente o que vieram fazer nesse mundo.

Passei o fim de semana pensando em como nos transformamos quando fazemos o que amamos. Os olhos brilham, o rosto se ilumina e o corpo todo vibra com vida. Pode ser cantar, desenhar, solucionar uma equação ou discursar sobre uma pesquisa científica. Não precisa ser uma profissão, mas qualquer atividade que preencha nosso coração e exponha nossa alma.

“Fala alguma coisa, por favor”, pediu o Dudu no carro, “você está tão quieta esses dias”. Tentei puxar assunto, mas minha mente vagava distante. Olhei pro senhor vendendo jornal no semáforo e me questionei sobre o que o deixava feliz. Talvez fosse apaixonado por plantas e seu jardim fosse o mais bonito do bairro, ou talvez assasse um churrasco como ninguém.

Acredito que todos nós temos algo que não necessariamente fazemos bem, mas que amamos fazer. Algo que não é movido por interesse, nem por dinheiro – que faz o tempo passar diferente e transforma problemas em desafios. Algo que, mais que felicidade, nos traz paz e pertencimento.

Esse algo está dentro de nós. A diferença é que alguns conseguem acessá-lo mais fácil que outros.

Depois de muito refletir, concluí que o blog tem esse efeito em mim. Por mais que goste de dançar, cozinhar e tricotar, nada me faz tão bem quanto esse espaço virtual. Não importa que não ganhe pelos textos e fotos que publico aqui – ou que muitos escrevam e fotografem melhor que eu -, pois simplesmente não consigo me imaginar não fazendo isso.

Pode soar romântico demais, mas acredito que a verdadeira mágica está em quando conseguimos, através de nossa paixão, ter um efeito em outras pessoas. Quando, com a mais pura das intenções, somos capazes de mudar vidas – seja servindo, ajudando ou inspirando. Para mim, essa é a nossa verdadeira contribuição para o mundo. E é dela que vou atrás.

(Depois descobri outro vídeo que me deixou hipnotizada. É uma mulher interpretando uma música do Eminem em linguagem de sinais. É tão intenso e profundo. Vale a pena.)

bottom of page